04/01/10

Fundamentalismo


Sei que os textos de César das Neves não merecem à partida grande atenção por parte de alguém com um mínimo de inteligência. Porém, dado que o que este escreve no seu artigo de hoje no DN reflecte muito do que tenho ouvido e lido ultimamente aos opositores ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, vou-me debruçar sobre algumas dessas questões.
Passando por alto a atribuição do epíteto de "homicida" ao governo, e, já agora, à maioria das pessoas que votou no referendo à questão do aborto, César das Neves brinda-nos com uma concepção do actual modo de vida digna do melhor humor. Non sense, claro está. Discorre sobre "máquinas de controlo mental", comandadas por não se sabe quem, às quais, ele, iluminado, consegue sobrepor-se. Sendo esta a razão que nos faz aceitar sem grande sobressalto a alteração à lei do casamento, algo que é, segundo o próprio, uma alteração muito mais radical que uma revisão constitucional. Neste ponto posso até concordar, já que o avanço em termos de liberdades direitos e garantias é maior do que na maioria das revisões já efectuadas à lei fundamental.
Mas, o que me faz comentar este artigo em particular é a parte em que JCN considera o governo como "patético insistindo na lei perante a desgraça dos desempregados, descalabro financeiro, apatia geral." Os opositores à lei que consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo primeiro eram contra, depois, quando os votos na AR já não chegavam para travar a lei, queriam referendo, depois, era a questão da adopção, que este continuaria a ser um casamento de segunda, e por aí adiante. Até que chegamos ao argumento bacoco de que esta não é uma questão essencial e que há outras questões mais importantes como o défice e o desemprego. E é este o argumento que mais vemos ser explorado pelos partidários do não.
Curioso é que JCN diz no mesmo texto, com o desplante de quem não acabou de escrever os parágrafos anteriores que " mudar o casamento faz-se numa simples manhã, entre dois decretos polémicos". Ora aqui está a verdadeira questão. Na AR discute-se legislação todos os dias, sobre os mais variados temas. Não é por se aprovar este diploma que o desemprego, o défice ou a reforma da lei sobre os coutos de caça vão ser descurados. Esta é uma das grandes mentiras que se vai ouvindo cada vez mais a estes improváveis fãs de Enver Hoxha, famoso por se dedicar a uma política de cada vez.
PS: deixo, talvez para outra vez, a análise da sua visão sobre os últimos 200 anos de história, que não deixa de ser também hilariante.

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